terça-feira, 4 de março de 2014

Psicólogos no sistema prisional




Seguindo a proposta da última postagem do No Pé da Política, Educação em Prisões, iremos hoje falar de um assunto também controverso: o auxílio e a garantia de direitos de quem feriu os direitos humanos. Dentro desse contexto, encontra-se o Psicólogo do sistema prisional. O Brasil é o país com maior população carcerária do mundo, o que exige além da contribuição na construção de atribuições, competências e possibilidades de uma prática profissional cujo objetivo é integração social, exige também a contrução do diálogo com movimentos sociais e de parcerias nessa tarefa de compreender o modelo de privação de liberdade no Brasil. Segundo o Conselho Federal de Psicologia, todos os seus profissionais estão comprometidos com a ideia de construção de uma cultura de direitos humanos, com a valorização da cidadania e com a efetivação da democracia.

A psicologia inserida nesse contexto é uma especialidade que aplica os seus saberes nas várias áreas da justiça e essa especialidade está em total desenvolvimento. A necessidade do trabalho do psicólogo dentro do mundo jurídico já vem sendo questionada há séculos e é visto de suma importância. No intuito de qualificar as intervenções no Sistema Prisional, é necessário compreender que a prática psicológica convive com as graves e inúmeras dificuldades pelas quais passa o Sistema Prisional: a sua precariedade, como as deficiências nas condições de trabalho, pequenos ou muitas vezes inexistentes quadros de profissionais nas unidades; procedimentos de segurança em detrimento das práticas de reinserção social, entre outras dificuldades. A qualificação profissional do psicólogo está pautada na perspectiva da reintegração social, superando o modelo de classificação e estigmatização dos indivíduos. Portanto, propõe trabalhar na construção de uma prática que visa as políticas públicas e os direitos humanos.

O trabalho dos psicólogos no sistema prisional foi delimitado com a criação da Lei 7.210, em 1984, conhecida como a Lei de Execuções Penais (LEP). A Lei estendeu para as penitenciárias o campo de atuação do psicólogo e instituiu o exame criminológico e a comissão técnica de classificação (CTC), técnicas essas utilizadas para fazer o acompanhamento individual da pena, ajustando a execução da pena ao preso condenado. Em 2003, a nova lei 10.792 alterou dois artigos da LEP que aboliu o acompanhamento da execução pela CTC e o exame crimiológico para benefícios legais do livramento condicional e da progressão de regime, passando a ser exigido, tão somente, a declaração de comportamento carcerário do preso emitida pelo diretor do estabelecimento prisional.

A atual concepção de Estado baseia-se na compreensão de que toda a estrutura estatal deve voltar-se para a promoção e proteção dos direitos humanos (civis, políticos, sociais, econômicos, culturais, difusos e coletivos). O Estado de Direito brasileiro,  fundamentado pela Constituição de 1988, reconhece e protege tais direitos, ao estabelecer que “são direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados”.

Seguindo essa concepção, o Conselho Federal de Psicologia lançou uma  RESOLUÇÃO CFP 012/2011 com o objetivo de regulamentar a atuação do psicólogo no âmbito do sistema prisional:

Art. 1º. Em todas as práticas no âmbito do sistema prisional, a(o) psicóloga(o) deverá respeitar e promover:

a) Os direitos humanos dos sujeitos em privação de liberdade, atuando em âmbito institucional e interdisciplinar;

b) Os processos de construção da cidadania, em contraposição à cultura de primazia da segurança, de vingança social e de disciplinarização do indivíduo;

c) A desconstrução do conceito de que o crime está relacionado unicamente à patologia ou à história individual, enfatizando os dispositivos sociais que promovem o processo de criminalização;

d) A construção de estratégias que visem ao fortalecimento dos laços sociais e uma participação maior dos sujeitos por meio de projetos interdisciplinares que tenham por objetivo o resgate da cidadania e a inserção na sociedade extramuros.

Art. 2º. Em relação à atuação com a população em privação de liberdade ou em medida de segurança, a(o) psicóloga(o) deverá:

a) Compreender os sujeitos na sua totalidade histórica, social, cultural, humana e emocional;

b) Promover práticas que potencializem a vida em liberdade, de modo a construir e fortalecer dispositivos que estimulem a autonomia e a expressão da individualidade dos envolvidos no atendimento;

c) Construir dispositivos de superação das lógicas maniqueístas que atuam na instituição e na sociedade, principalmente com relação a projetos de saúde e reintegração social;

d) Atuar na promoção de saúde mental, a partir dos pressupostos antimanicomiais, tendo como referência fundamental a Lei da Reforma Psiquiátrica, Lei n° 10.216/2001, visando a favorecer a criação ou o fortalecimento dos laços sociais e comunitários e a atenção integral;

e) Desenvolver e participar da construção de redes nos serviços públicos de saúde/saúde mental para as pessoas em cumprimento de pena (privativa de liberdade e restritiva de direitos), bem como de medidas de segurança;

f) Ter autonomia teórica, técnica e metodológica, de acordo com os princípios ético-políticos que norteiam a profissão.

Parágrafo Único: É vedado à(ao) psicóloga(o) participar de procedimentos que envolvam as práticas de caráter punitivo e disciplinar, notadamente os de apuração de faltas disciplinares.

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